Miss Mato Grosso Gay 1980, conta que usou silicone industrial e hoje se arrepende devido às consequências de um câncer

Travesti, que ganhou fama nacional, conta que usou produtos ilegais e hoje se arrepende devido às consequências

HELSON FRANÇA
Da Reportagem

Figura tradicional das celebrações da sociedade cuiabana, sobretudo na década de 80, a travesti Úrsula, 57, anos, esteve presente em momentos importantes da cidade como a inauguração do Estádio do Verdão. Ela também ganhou vários prêmios nacionais de miss gay e é considerada um expoente do grupo LGBT no Estado. Mesmo como toda essa trajetória, atualmente, ela vive um drama.                                                             

Foto: Geraldo Tavares/DC - Úrsula guarda fotos e recortes da época em que era convidada de honra em eventos

Morando de favor na casa de uma sobrinha, localizada no bairro Jardim Gramado, em Cuiabá, ela convive com dores desde agosto do ano passado. No começo deste ano, o diagnóstico: câncer.

Situado na região do reto, o tumor, segundo a travesti, é resultado das aplicações de silicone industrial que realizou nos quadris e nádegas em Curitiba (PR), quando tinha 27 anos.


Tendo em sua composição elementos muitas vezes fora das
especificações médicas e sanitárias, os silicones industriais – utilizados geralmente para outros fins – são considerados produto cancerígeno.

Ela colocou três litros do material em cada lado do corpo, além de uma quantidade no rosto também.

“Se eu pudesse voltar atrás, não teria feito isso comigo”, desabafa, ao comentar que se arrepende de ter feito as intervenções.

Úrsula passa a maior parte de seus dias de pé. Por conta das dores, ela não consegue sentar.

“Tem dias que as dores são tão fortes que não consigo nem dormir. É complicado”.

Devido aos antibióticos e remédios que tomou no final de dezembro do ano passado, quando foi internada às pressas no pronto-socorro Municipal de Várzea Grande para tratar de um enfisema pulmonar, os silicones incharam e endureceram.

“Preciso fazer uma cirurgia para tirá-los, mas os médicos falaram que antes é necessário cuidar do tumor”.

Ela dará início às sessões de radioterapia e quimioterapia no próximo dia 22, na Santa Casa, em Cuiabá. Ao todo, serão 35 sessões.

A travesti conta que nasceu com uma disfunção hormonal e se sentia mais mulher do que homem. Perto de completar 14 anos, Emílio José Borges – seu nome de batismo – começou, com o apoio da família, a tomar hormônios para que o lado feminino aflorasse.

Aos poucos, cintura e voz foram se afinando, e os seios aparecendo. Ela disse que cogitou fazer uma cirurgia de mudança de sexo, mas abandonou a ideia por considerá-la arriscada.

Eleita miss gay de Mato Grosso em 1980 e segundo lugar no concurso nacional no ano seguinte, Úrsula relata que já ganhou bastante dinheiro com a prostituição – tendo uma clientela formada por políticos e empresários, em sua maioria -, mas foi roubada por dois ex-maridos.

Hoje, a senhora de idade, como se define, além da sobrinha, não tem muito contato com a família – com exceção da irmã que mora em João Pessoa (PA) – e espera voltar a ter uma vida normal, depois que o tratamento findar.

“A fé move montanhas, não é?”, diz. 


FONTE: Diário de Cuiabá © 2012
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